Na Teia do Destino
As últimas obras da lista dos dez filmes noir obrigatórios foram os pilares que firmaram o gênero. “Relíquia Macabra” estabeleceu seus códigos, “Pacto de Sangue” o elevou à categoria de “arte” e “A Morte Num Beijo” e “O Grande Golpe” o distorceu e renovou. O filme de hoje, porém, representou o primeiro passo em outro sentido: sua subversão.
6º – Na Teia do Destino (The Reckless Moment) – 1949
Esqueça os becos imundos, o submundo do crime e as investigações enroladas. O sensível e sutil “Na Teia do Destino”, do alemão Max Ophüls, se passa quase que inteiramente nos subúrbios norte-americanos, no seio da família nuclear. Um dia, a matriarca, Lucia (Joan Bennett), encontra o corpo do amante que sua filha rebelde acidentalmente matou. O elemento noir entra quando Martin Donnelly (James Mason), trambiqueiro amigo do falecido, passa a chantagear Lucia. Ao longo do tempo, porém, Martin comove-se com a simplicidade da vida doméstica de Lucia e decide ajudá-la.
Se entendermos o papel da femme fatale como a mulher que seduz e destrói a vida de um homem, a grande crítica por trás de “Na Teia do Destino” fica clara. Aqui, a femme fatale seduz pela sua bondade, e não por seu sex appeal, e destrói o homem por incutir nele o desejo de fazer o bem, e não por corrompê-lo. Colocando nesses termos, Ophüls sutilmente aponta o alto teor de misoginia que impregna o gênero desde a sua fundação. Também há outro aspecto crítico na obra, já que, ao longo do filme, pessoas dispensáveis precisam ser sacrificadas para que a ordem e a unidade familiar possam continuar intactas. A família, símbolo da sociedade norte-americana, justifica o sangue derramado para mantê-la?
Confira abaixo o trailer original do filme.
Veja mais: Outro diretor notável, Nicholas Ray, também subverteu o gênero e o levou a lugares nunca antes explorados. “Cinzas Que Queimam” (On Dangerous Ground), de 1952, por exemplo, é um estudo notável de como o combate à imundície das ruas acaba por também por tornar imunda a própria força policial. Veja o trailer aqui. O noir mais famoso de Ray, “No Silêncio da Noite” (In a Lonely Place), de 1950, vai um passo além ao realizar um complexo estudo de personagem e das origens da psicopatia. No enredo, o roteirista Dixon Steele (Humphrey Bogart) é o principal suspeito de ter brutalmente assassinado uma jovem. Sua vizianha, apesar da suspeita, se apaixona por Dixon. Seu comportamento violento, contudo, a faz desconfiar cada vez mais de sua inocência. Veja o trailer aqui.
Texto: Pedro Rech
Imagem: Divulgação