Indignar-se com o quê
Confira abaixo mais um texto produzido por uma estudante da disciplina de Mídia Impressa. O gênero trabalhado é opinativo.
Morreu o papeleiro que teve o corpo incendiado no dia 21 de setembro, em Caxias do Sul. Carlos Miguel dos Santos, 45 anos, teve 85% do corpo queimado por quatro adolescentes, tendo como causa uma futilidade: uma dívida de R$ 2.
A imprensa fica indignada, ficam indignados os cidadãos. Uma morte, um crime, quão terrível pode ser o ser humano! Entretanto, onde morava esse papeleiro, em que situação ele se encontrava? É de se questionar: se ele morasse em uma casa, e não em um barraco, em condições precárias, correria o mesmo risco de sofrer esse tipo de violência? Aqueles jovens que o assassinaram, se estivessem na escola, ou mesmo em casa, assistidos pelos pais, teriam a mesma probabilidade de cometer aquele crime? Há muitos poréns por trás desse fato que merecem um questionamento.
Parece que hoje nos indignamos com pouco. Apenas mortes e tragédias podem despertar nossos instintos. Mas aqueles que dormem nas ruas, pessoas pelas quais passamos diariamente, não nos deixam mais indignados. As crianças afetadas pela falta de cuidado dos pais já são fato habitual. A falta de comida, de acesso e de educação não nos atingem mais da forma com que deveriam. É necessário indignar-se um pouco mais, agir, cobrar das pessoas e do governo uma assistência adequada que chegue a todos. A todos.
Quem sabe devamos pensar um pouco mais como John Donne, poeta inglês do século 16, citado no livro Por Quem Os Sinos Dobram, de Ernest Hemingway. “Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo; todos são parte do continente, uma parte de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio; a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”.
Agora os sinos estão dobrando. Dobrando pela nossa falta de cuidado, falta de educação, e principalmente de sensibilidade. Dobram por Carlos Miguel dos Santos, e também por cada um de nós. E dobrarão sem cessar, até que as pessoas mudem, e façam mudar a sociedade como um todo.
Texto: Gabriela Zanezi